segunda-feira, outubro 31, 2011

O racismo nosso de cada dia (Parte II)


Como eu havia prometido, eis aqui a continuação de "O Racismo nosso de cada dia":


   É triste você,desde criança,constatar no seu dia a dia que a maioria das pessoas com as quais você convive, no fundo,no fundo são racistas. Pior ainda é constatar que a sua própria família é racista.E isso nas pequenas coisas. Essa história é longa e envolve uma série de pessoas que me cercam. Mas vamos lá!Tentarei ser breve,mas será possível sê-lo????



APARÊNCIA FÍSICA:

   A minha mãe era(sim,ela já partiu há 10 anos!) branca,sardenta e ruiva e o meu pai é caboclo! Dessa bela mistura,eu nasci:


                                                             E dessa bela mistura,eu nasci!




      Meus primos por parte de mãe são,em sua maioria,loiros,de olhos e pele claras.E eu,desde bebezinha, ganhei a alcunha de "A ÚNICA MORENA DA FAMÍLIA"! Ok,nunca tive trauma algum disso.Muito pelo contrário: eu sempre gostei de remar contra a maré e ser a diferentona. E é isso que eu sou! Em todos os sentidos,contrario a maioria dos costumes da minha família por parte de mãe! Ser "A ÚNICA MORENA DA FAMÍLIA" sempre foi motivo de orgulho pra mim!
     Já a minha família por parte de pai é uma mistura de negros e índios. O meu pai sempre teve muito orgulho de sua ancestralidade,coisa que aprendeu com o pai dele,meu avô,então negro de olhos verdes,por ser neto de holandeses.Esse orgulho e elevada autoestima foram transmitidos a mim por eles! Meu pai,sempre vanguardista, adotou os cabelos em estilo "black power" quando jovem,enquanto a maioria das pessoas achava( e ainda acha!) melhor raspar a cabeça. Mas nem tudo são flores: infeliz e surpreendentemente, a família do meu pai é bastante racista, o que pra mim sempre foi contraditório e até hoje é difícil de compreender. Na mente das minhas tias e primas paternas,cabelo liso é que é cabelo "bom" e "bonito"(AI,COMO ODEIO ESSAS EXPRESSÕES!). Por mais louco que seja,nesses meus 27 aninhos de vida, nuncas as vi com o cabelo natural: elas sempre fizeram escova e agora,com a modernidade em termos capilares, adotaram a tal da escova progressiva! Já eu,como sempre,remando contra a maré, uso meus cabelos naturalmente cacheados,sem qualquer vergonha ou baixa autoestima.NUNCA FIZ CHAPINHA NA MINHA VIDA,embora minhas tias e primas insistam em tentar me convencer de que eu tenho mesmo é que fazê-la,além é claro das cabeleireiras que são louuuuuuuuuuuucas para alisarem os meus lindos cachinhos negros! Mas não cederei às pressões! Sou muito bem resolvida assim,obrigada!
      As pessoas em geral ( e em particular,algumas pessoas da minha família), associam o ser negro a ser feio.Como já mencionei acima,os cabelos(crespos,cacheados), o nariz,(grande e redondo) a boca(lábios carnudos),etc.,são considerados feios; não é à toa que muita gente(famosa e anônima), quer afinar o nariz ou os lábios(se bem que agora é moda ter boca carnuda igual a da Angelina Jolie!)e,é claro,quer ser loiro e/ou ter os cabelos lisos. O interessante disso tudo é que,geralmente,essas pessoas que acham que ser negro E SE ASSUMIR NEGRO é algo feio,são pessoas que nem se conhecem a fundo.São invejosas,recalcadas e de baixa autoestima. Morrem de vergonha ao assumirem que têm algum ancestral negro. Tenho pena dessa galera!
    E o que dizer das filas de adoção??!!! Um absurdo! A maioria dos casais candidatos a pais querem crianças loiras,brancas,de olhos verdes/azuis...E sabemos que a maioria das crianças nos orfanatos são negras.  Será que amor paternal tem cor???




RELACIONAMENTOS INTER-ÉTNICOS: 


   Isso é algo bastante polêmico! Eu diria que,depois da aparência física, é aí que o racismo mais se esconde!
   Cara, um casal inter-étnico é a coisa mais normal no Brasil.Nem dá pra entender porque as pessoas causam tanta polêmica por conta disso!
   Eu vejo os casais na rua,a mulher negra e o homem branco,ou vice-versa, e todo mundo olhando,como se fosse um absurdo isso! Mas a pior situação é na família,quando você apresenta seu(sua) namorado(a) , sendo ele(a) de outra etnia.Dependendo dos seus pais,irmãos,avós,tios,vai ser tranquilo,mas nem sempre é assim que funciona. Enquanto vocês estão somente namorando,é tudo lindo,maravilhoso.Mas aí,vocês decidem se casar:AÍ COMEÇAM OS COMENTÁRIOS DO TIPO:

  • "E os filhos de vocês??? Como serão???-  mulatos,ora bolas?!
  • "E como vai ser para pentear os cabelos deles? Os cabelos deles vão ser ruins...Ai,meu Deus,tomara que os meus netinhos nasçam com o cabelo "bom"!  
  • "Será que vão nascer com nariz de batata???"
        Não aguento mais tanta futilidade! Ao invés de ficarem felizes pelo casamento do(a) filho(a), há famílias que conjecturam sobre questões tão banais!!!! Por que não desejam apenas que sejam felizes e que tenham filhos saudáveis???
        Meus pais passaram por isso! Quando minha mãe apresentou o meu pai aos meus avós e tios,eles ficaram olhando pra ele de banda.Meu pai nunca esquentou com isso! Anos depois,quando anunciaram o casamento,as questões mencionadas acima foram levantadas! Mas eles se casaram,eu nasci,e estou aqui contando essas coisinhas a vocês! Sim,nasci com nariz de batata,pra desespero de muita gente da minha família! Sim,meu cabelo é ruim na concepção deles. E sou,até hoje,obrigada a conviver com esses comentários desagradáveis.SINAL MAIS DO QUE GRITANTE QUE,POR MAIS QUE NÃO QUEIRAMOS ENXERGAR,O RACISMO ESTÁ AÍ E ESTÁ BEM PRESENTE NO NOSSO DIA A DIA! 
       
     Pensem nisso!


Gabriela



 
 
     

6 comentários:

Graziela Melo disse...

Quando eu era criança, ouvia vários relatos de racismo vindo de parentes, amigos e até mesmo família. Sou morena(branca), olhos castanhos claros, cabelos cacheados claro e tenho 1,50 de altura. Sempre ouvi racismo da parte de eu ser baixinha, ter cabelo cacheado, olhos que não são azuis e, inclusive, por eu ser deficiente física. Nasci com Raquitismo Renal e sofri (ainda sofro) bullying na escola por parte de alunos, alguns professores e funcionários. Sou descendente de negros, portugueses e franceses. Minha vó é negra(parte de pai), minha bisavó era branca com olhos bem azuis profundos (parte de mãe), então, tenho orgulho das minhas raízes e concordo que não devemos ser aptos à nenhum tipo de preconceito. Seja ele contra a cor, tipo físico, cabelo, sexualidade, cor dos olhos e etc. Deus fez cada um com uma beleza e essência única e especial. Você é linda Gabi, todos nós somos! Lindo Blog! (OBS: Não tenho Blog, mais vim postar aqui)

Arthur Caldas disse...

Excelente! Precisamos erradicar esse racismo primeitramente na nossa família. Já ouvi algumas expressões tais como: "olha que negro ou caboclo bonito" - a regra é ser feio? Nossa! Também faço parte das minorias principalmete por ser nortista e ter vindo etnicamente do negro, índio e branco. Mas como sou um caboclo amazonense, a ignorância e o preconceito são redobrados: uma pela localização geográfica; a outra pela aparência. Sou menos brasileiro por isso? O nordestino é menos brasileiro por ser nordestino? Nosso preconceito é velado e hipócrita! Grupos em São Paulo, de "brancos tupiniquins", continuam provocando o terror aos que não possuem o mesmo sotaque, cor e opção sexual. Se queremos um Brasil realmente de todos, temos que assumir que, ifelizmente,esse tipo de preconceito que assola, humilha e que envergonha a nossa nação existe. A partir daí, temos que combater e ensinar as crianças e jovens uma nova visão de respeito e dignidade entre os brasileiros.

Willian Alves de Almeida disse...

Verdade absoluta! Esses esterótipos que você cita, refletem a hipocrisia de nossa sociedade. Assim como você, sou de uma família de uma mistura étnica intensa, e tenho lábios carnudos e nariz de Batata que não negam a ascendência negra do meu avô materno.
Muitas pessoas dizem que meus lábios são lindos (modéstia à parte, rsrs), mas minhas tias e até minha mãe que tem cabelo crespo, vivem com as idéias que você falou sobre ter o cabelo "bom".
Essas idéias devem ser combatidas pouco à pouco, assim conseguiremos mudar isso!

Bjs, Will

Rennan Rebello disse...

Concordo com tudo que disseste. Isso rola muito por está enraízado no senso comum.

Mudar uma cultura milenar não é fácil, mas é bom saber, ver e ler que há pessoas como ti que vão contra a maré. Eu, apesar de negro muitas pessoas falam que eu sou moreno pois bem, cada um fala o que quer e eu nem ligo. Nunca sofri preconceito mas também não estou imune, um dia sofrerei mas eu jogo no time do seu coroa ou seja, tô nem aí...

O melhor a ser feito é desprezar o preconceituoso e seguir seu caminho, seguir o que você acredita mas é lógico que sou a favor denúncias contra preconceituosos mas aí já é outro papo.

Pois bem, PARABÉNS (outra vez!)
Ps´Lembrando que há (nem que seja em menor escala) preconceito de Negros contra Brancos...

Florzinha disse...

Ótimo post, Gabi!

Quero só ver me apresentarem algum brasileiro que seja 100% alguma coisa. Particularmente, me sinto incomodada quando leio na minha certidão de nascimento "de cor branca", pra começar que o sujeito do cartório nem viu minha carinha quando escreveu isso, depois, ele não viu minha família, só meu pai (nem sei se ele é branco!) e fora que eu acho que isso não devia ser citado já que não pode ser comprovado que algum brasileiro seja "branco" com tantas misturas. E ainda que se pudesse provar isso, é relevante?

Uma vez fiquei indignada com um vizinho que disse da própria esposa: "ela é, assim, de cor, mas é boa pessoa". Como assim?????? A cor da pele influi no caráter? E o pior é ele ser casado com ela e me sair com uma dessas.

Mas, como alguém aí em cima disse, é um pensamento que está entranhado na nossa cultura há tanto tempo que fica difícil mudar.

Zélia Cunha disse...

Oi, Gabriela

Passei por aqui e achei bem interessante o assunto. Eu também sou a única negra na família , pois meu pai era negro e sempre ouvia , quando criança, algumas brincadeiras lá em casa do tipo: Ela foi achada em uma carroça de carvão ou ela nasceu em noite escura de tempestade. Meu apelido era Negrinha e isso não me incomodava até entrar na escola, pois foi lá que comecei a entender certas coisas que para mim não tinham importância. Hoje sou professora e luto pela igualdade entre meus alunos, sempre trabalho com as diferenças e incentivo-os a terem orgulho de suas origens e elevar sua autoestima. Mas ainda é necessário muita luta para colocar na mente das pessoas que nós , brasileiros, somos produto da miscigenação de várias raças.
Beijos, querida.
^.^